sábado, 6 de agosto de 2016

Reduzir salários de vereadores adianta? - Um ensaio sobre o lobby maçon na reunião dos vereadores em Muzambinho.



Engravatados ostentando em suas lapelas o símbolo do esquadro e do compasso, assistiam lá do fundo do salão a reunião. Acompanhavam melancolicamente o transcorrer dos pronunciamentos, todos eles, tentando explicar qual o significado de representar o povo. No transcorrer de duas horas, o lavrador, o açougueiro, o pedreiro, a aposentada, o sindicalista, todos com médio ou poucos estudos, explicavam aos doutores didaticamente por qual motivo estavam por lá, e por qual motivos lhes era justo receber seu soldo.
Os cultos e idôneos senhores, médico, farmacêuticos, dentista, advogados, empresários, fazendeiros, e outros profissionais, em silêncio, ouviam lições de cidadania dos verdadeiros representantes do povo. E qual era o desejo destes? Reduzir os subsídios dos já mal remunerados legítimos representantes do povo, ainda a serem eleitos dois meses depois.
Vontade popular! Esses senhores pouco letrados que decidem em nome do povo não podem receber bem! E quem dirá dos próximos, a serem escolhidos em outubro? Ainda anônimos, acusados de que não vão fazer nada na próxima legislatura, ainda que nas mãos do próprio povo (e não dos atuais vereadores) a escolha dos funcionários da casa para o ano de 2017.
Há 300 anos atrás, um barão, membro das elites francesas em períodos absolutistas, escreveu um texto onde dizia que um governo do povo precisava ter um sistema de controles, onde o poder não ficava apenas na mão de um rei, mas repartido entre três órgãos, e um deles, saído do povo, que faria as Leis. Caberia aos reis e aos barões executá-las, e se sujeitarem às fiscalizações desses representantes, que viriam de todas as classes, inclusive entre os pobres e incultos.
A essência da idéia do barão de Montesquieu, seu magnum opus “O Espírito das Leis” era diluir a concentração do poder da mão dos barões e dos doutores, e passar uma fração deste ao povo, através de seus representantes. Parte da luta por esses ideais foi incorporado por vários estudiosos, por Estados e por ordens, como por aquela fundada pelos construtores de catedrais da velha Inglaterra, a Maçonaria.
Hoje, paradoxalmente, os barões e doutores querem menos poder aos representantes do povo. E menos poder ainda para aqueles desacreditados que ainda serão eleitos por todo povo daqui a dois meses. De porte de seus ternos e insígnias, intimidam simbolicamente, com olhares fixos e porte disciplinado. Ternos finíssimos por sinal, que intimidam os amarrotados jalecos dos parlamentares que lá exerciam sua representação.
Ora, o que é Poder? A Carta Magna diz que ele emana do povo, através de seus representantes eleitos, mas desde pequeno eu ouvi falar que quem mandava era o Capital. Também ouvi falar que quem mandava era a Maçonaria, ordem dos poderosos, membros das forças ocultas, por trás dos poderes. Forças ocultas estas, capazes de mobilizar o capital em prol da eleição de pessoas para defender seus interesses.
Não foi isso que pareceu. “Eu sempre pensei que a maçonaria era poderosa”, mas mesmo assim o eletricista, o professor, o agricultor familiar, contavam o porquê de seus cargos e diziam: “a gente representa sim, e trabalha, e todo mundo aqui pode ser demitido dia 2 de outubro, nas urnas”.
Ora, numa sociedade democrática, quem deve ter o poder? A elite engravatada ou aqueles escolhidos pelo povo? E quem ganha mais dinheiro? O vereador ou o médico, o advogado, o dentista, o fazendeiro? Lá não pairava dúvidas sobre quem tinha mais poder econômico, mas, despontava no ar, uma suspeita de quem tinha mais poder de verdade, mais poder legítimo.
O bem-sucedido empresário não conseguia verba do deputado para a sua associação e precisou da ajuda do pobre e precariamente escolarizado vereador. O fazendeiro precisava da autorização do legislador para regularizar seu loteamento. O médico precisava da intervenção do parlamentar para exercer de forma plena seu ministério na casa de saúde pública.
Mas não era assim que parecia. Nós, poderosos da maçonaria, viemos aqui exigir: vocês não podem ganhar muito. Esquece o engravatado que precisou do poder público para as verbas para a creche, o hospital, o Asilo, a ambulância, a Lei, o contrato, etc.
Quando vejo o povo se queixar do que irão pagar para os representantes que ainda vão escolher, nunca tenho certeza se é ingenuidade ou despeito pela incapacidade de ser escolhido como representante do povo. Mas de qualquer forma verdades precisam ser ditas.
A primeira delas, e mais dura: o aumento do salário do vereador causa um impacto insignificante aos cofres públicos. Reduzir os salários só poderia reduzir a qualidade do trabalho do vereador e gerar mais gastos públicos, já que hoje, a soma dos salários de todos os vereadores e outros 9 servidores da Casa Legislativa é inferior a 0,3% da Receita Corrente Líquida do município, incomparável com as despesas com juros, previdência social, encargos para contratos de obras ou mesmo os 15% gastos com transporte escolar.
Isso levando em conta que o orçamento do município é insignificante perto do orçamento do Estado e da União. Os engravatados não tiveram coragem de questionar os 55 mil recebidos pelo juiz da comarca no mês de junho, sendo 7 ml de indenizações e mais de 29 mil em verbas adicionais, que incluem diárias de mais de 500 reais para trabalhar em cidades de distância inferior a 30 km, sem pernoite. E veja ainda os salários de outros servidores do Judiciário, do Ministério Público e de outros poderes, não eleitos e nem representantes do povo, impossíveis de serem demitidos pelo voto do povo em 2 de outubro.
Por trás de um discurso pretenso de democracia e cidadania, transmitem (ainda que ingenuamente e imbuídos de boa fé), uma péssima lição às futuras gerações, desvalorizando o poder legítimo, e desestimulando as pessoas idealistas de ocuparem cargos eletivos.
Protestar contra o salário dos vereadores não é bonito! É desvalorizar algo que faz parte da essência da democracia. Deveria se trabalhar para que o povo seja educado para votar bem e fiscalizar a atuação do parlamentar, incluindo não se votar para “pagar um favor” e para que política seja leva a sério, e para que os jovens sonhadores ingressem na política.
Nunca tive vontade de ser Demolay – disciplina rígida não me interessa – mas não me conformava de nunca terem me convidado. Como assim? Eu? Um homem sonhador, despegado de dinheiro, trabalhador.... Mas, muitos de meus colegas que se tornaram demolays são hoje engenheiros, cientistas, economistas, empresários, advogados e médicos, mas, talvez nenhum, político. Porquê não?
Não proteste pelo salário do vereador. Proteste para que o vereador trabalhe, e, nesse momento, que o povo vote naqueles que tiverem o melhor histórico, as melhores chances de representar o povo.

Quanto aos maçons, há coisas que eles podem fazer que representariam mais economia aos cofres públicos, como prestar serviços de médico, dentista e farmacêutico gratuitamente no hospital, dispensando serviços extraordinários ou suas despesas; desocupar bens pertencentes às sociedades beneficentes para que sejam usufruídos por profissionais contratados pelo poder público, com limitação de lucros; fornecer bens e serviços a preço de custos; prestar serviços voluntários; abrir mão de pagamentos como defensores públicos ou pagamentos do SUS, etc.

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