O Cartesiano de Muzambinho que impetrou HC preventivo em favor de Lula,
me ajudou a ter importante vitória jurídica e me apresentou ao Último Teorema de
Fermat
Maurício Ramos
Thomáz, figura mais noticiada em 27 de julho de 2015, por ter entrado com um
pedido de Habeas Corpus para evitar que Lula seja preso na Operação Lava Jato,
é meu conhecido pessoal, e, por cerca de dez anos morou em Muzambinho, minha
cidade natal e onde residi toda vida. Em Muzambinho ele protagonizou seus
principais e iniciais episódios de figura polêmica. A repercussão do simples HC
para Lula se deu pelo fato de que a notícia do mesmo foi dada por Ronaldo
Caiado. Ele foi alvo da crítica de Esquerda e Direito, acusado de tentar ter
seus cinco minutos de fama, de ser um “Napoleão de Hospício” ou de agir por
instrução da oposição, e, nada disso pode ser verdade.
Falo
dele, pois ele é responsável pela redação da maior vitória judicial que eu tive
em Muzambinho, derrotando e humilhando os meus oito outros colegas vereadores
em novembro de 2011 num episódio em que os meus grandes aliados eram apenas as
pessoas simples da cidade e nenhum advogado estava disposto a me defender,
pois, eu havia comprado uma briga com o único juiz da comarca, autodeclarado
suspeito em meus processos. Maurício comprou a minha briga e me defendeu, com
vitória surpreendente.
Maurício,
diferentemente do que se fala, nem tenta aparecer e de maluco é tão maluco
quanto grande parte das figuras da Política, Mídia, Ciência, Esportes, Artes,
etc. Ele não quer se exibir, não tem intenção de ter fama, não quer defender
uma ideologia partidária política e nem tem intenção de fazer algo de bom ou
ruim ao PT, apesar dele ser eleitor e defensor político do PT. Acontece que Maurício
encara o Direito como Ciência Exata, e ele acha insuportável o comportamento de
magistrados em qualquer coisa que fuja às normas. A lógica dele é impecável, de
fato positivista, e o direito para ele é axiomático - e claro, inadequada para
a realidade tanto da safadeza do Poder Judiciário (patente na promiscua ação do
juiz Moro) quanto para um Direito para o bem comum.
Entre
as peripécias de Maurício no judiciário está o pedido de Impeachment de dez dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal,
encaminhados ao próprio STF, e, um HC em favor do ultra-conservador direitista
Diego Mainardi, ambas ações sem efeito, mas, dentro da lógica do próprio
Direito, desconsiderando a realidade, precisavam ser acatados.
Maurício
me despertou certo fascínio como personagem quando ele já havia ido embora de
Muzambinho e eu comecei a me interessar e envolver com uma política mais séria
do ponto de vista programático (pois política de eleição de quadros eu já
gostava desde a infância, meu pai foi vereador, vice-prefeito e candidato a
prefeito).
Maurício
tem dois episódios muito interessantes. É verdade que o Maurício soltou várias
pessoas em Guaxupé, inclusive traficantes. Ele foi preso nos anos 90 pela Lei
da Imprensa pois escreveu um texto no Jornal da Região que começava: "Quem
acredita que o concurso da escola agrícola de Muzambinho foi honesta acredita
em Papai Noel, duende e que o Carlos Dozza é um bom promotor". A Anistia
Internacional entrou em defesa dele sem sucesso, mas ele ficou pouco tempo
preso ... No período que esteve na cadeia apreendeu a redigir HC e impetrou 27
pedidos para soltar presidiários e conseguiu soltar 13 pessoas (não sei se os
números são esses, mas, fala-se em algo do tipo aqui pela cidade, o que o
Maurício se recusa em entrar em detalhes, como ele faz com todos os seus casos).
Como ele obteve sucesso com um importante traficante (que nunca lhe falou
sequer obrigado, também, conforme relatam) ele tomou gosto pela coisa, mas sem
interesse de obter gratidão.
Existe um
livro chamado "O Relógio de Pascal" do Caio Túlio Costa, mineiro de
Alfenas, a 70 km de Muzambinho, com um capítulo chamado "O Cartesiano de
Muzambinho" sobre o Maurício, mas o livro tem uns 15 anos já. O
capítulo narra a participação diária de Maurício em missivas para o escritor
quando o mesmo era ombudsman do
jornal “A Folha de S. Paulo”. Já conversei com Maurício sobre esse título de
cartesiano, que ele não apenas rejeita, mas pode lhe atacar de forma extremamente
hábil, defendendo-se com eficácia – de forma cartesiana – de ser um cartesiano.
Tive
vários atritos com Maurício Tomáz em virtude de seu discurso ortodoxo e
positivista, mas o admiro, e, minha mãe sempre diz: “não brigue com o Maurício,
seja grato a ele.”
O interessante
é que em 1995 o Maurício Thomáz (sem nunca ter ouvido falar em Andrew Willes)
era jornaleiro numa banca de Muzambinho e ele me apresentou o Último Teorema de
Fermat (que diz que não existe nenhuma terna do tipo a^n+b^n=c^n com a, b, c e
n inteiros se o n for maior que 2). Disse que quem demonstrasse ficaria rico ou
famoso (essa parte seria verdadeira, se o Teorema já não tivesse sido
demonstrado). Ele me motivou - com 16 anos - a buscar a solução do Teorema, que
fez eu gastar semanas e semanas com vários escritos e rascunhos, e claro, eu
nem imaginava o que era Matematica avançada e nem sabia que o Teorema já tinha
sido demonstrado (pelo menos em tese), mas eu já dava aulas e achei que poderia
me atrever a tentar.
A preocupação
de Maurício com o Último Teorema de Fermat é a mesma que ele tinha com o
Direito. Fazer as coisas seguindo rígidas regras de rigor matemático.
Infelizmente, na justiça, não há espaço para obedecer às regras do próprio
Direito, haja vista a grande quantidade de juízes analfabetos ou mal
intencionados. Claro, não é preciso ser tão rigoroso como Maurício e é possível
fugir um pouco à rigidez da Lei em favor do bem comum, mas o que vemos
ultimamente é um show de horrores, com gente burra (palavra usada por Maurício
numa entrevista sobre uma eventual recusa de Lula ao seu HC). Gente burra no
executivo, no legislativo, no judiciário e na imprensa.
Otávio Luciano Camargo Sales de Magalhães
Professor de
Matemática, mestre pela UNESP de Rio Claro.
Ex-vereador e
presidente da Câmara Municipal de Muzambinho.
Pesquisador de História
de Muzambinho.